Vai Vai: Samba, Hip Hop, racismo estrutural e a polícia que mata
Vai Vai, uma das mais tradicionais escolas de samba da cidade de São Paulo, em seu retorno ao Grupo Especial do Carnaval de São Paulo, em 2024, trouxe um enredo incrível e mega importante: o Hip Hop, movimento que tem 50 anos no mundo e 40 no Brasil, com base no disco “Sobrevivendo no Inferno”, do Racionais MC, mas especificamente na música “Capítulo 4, versículo 3”. Minha torcida era para Vai Vai desde quando soube do enredo. E agora, depois do desfile, da apuração e da “revolta” de delegados, policiais e políticos contra a escola e a ala que representou a força de Choque da Polícia Militar de São Paulo, tenho ainda mais certeza que Vai Vai mandou mega bem na escolha do tema, no enredo e na crítica social.
Delegados, “os polícia” e os políticos (não gosto e não confio em nenhum deles) acusam a escola de samba de “demonizar” a polícia, como se a polícia só matasse… Então vamos lá: eu moro em Santos, Baixada Santista, sou branca, privilegiada, moro em frente a praia, mas sou jornalista e se tem uma coisa que faço na vida é me informar, e no momento atual, inclusive durante o Carnaval, o que está rolando na Baixada Santista? A resposta: Operação Escudo, e até a sede da Secretaria de Segurança Pública do estado de São Paulo, mudou para Santos. Alegação para a tal operação: vingar a morte de policiais mortos em 2024 na região. Ano passado também rolou Operação Escudo depois da morte de um soldado.
Deixando claro que não sou a favor da morte de ninguém, sou da Paz, contra armas, tenho a consciência tranquila de defender os direitos humanos e ter votado a favor do Desarmamento, mas é preciso averiguar como a Operação Escudo age. Na mesma semana do desfile da Vai Vai policial da operação Escudo maltratou pessoas em São Vicente e atirou a queima roupa em um homem que tentava conversar para entender o que estava acontecendo. O homem inclusive é funcionário da Prefeitura de São Vicente. Até o momento a polícia já matou 20 pessoas que eles chamam de suspeitos, enquanto a população reclama do abuso de poder e da truculência da polícia que diz a Vai Vai a “demoniza”. Quem demoniza a Polícia é a própria Polícia! Vamos aos fatos: polícia não protege a população, polícia mata negros, pobres, periféricos, mas protege os piores bandidos, os chefões de tudo de ruim, porque esses geralmente são brancos, ricos e poderosos.
Devido a violência e truculência da Operação Escudo a prefeitura de São Vicente inclusive cancelou o Carnaval na cidade. E agora voltamos ao samba, ao Carnaval, ao racismo estrutural, ao Hip Hop e pensamento reacionário de um país que tem mais igrejas que escolas e hospitais e que uma das religiões que cresce cada vez mais faz o favor de “demonizar” outras religiões, principalmente as de matriz afro-brasileira enquanto se diz “perseguida”. E isso também está ligado ao tema Carnaval, ao samba, ao Hip Hop e ao racismo.
No Carnaval temos desfiles de “Escolas de Samba” – ainda bem que elas existem e resistem em suas comunidades fazendo muito mais para as pessoas que as polícias ou governos. O samba é criação da população negra, aquela cuja carne é a mais barata do mercado sempre, e as escolas de samba e os carnavais sempre foram pontos de encontro das comunidades, onde negros são bem-vindos e valorizados. O Carnaval é resistência, é cultura brasileira, um dos eventos que mais traz turistas de todo o mundo para o país! E é feito por pessoas de todas as cores, raças e credos, num sincretismo fantástico que só ocorre no Brasil e que fascina o mundo.
O samba nasceu nas periferias, com forte influência afro, foi conquistando as cidades, as pessoas de todas as raças, cores e credos e o Brasil se tornou responsável pelo maior espetáculo da Terra, chamado Carnaval com desfiles de escolas de samba, blocos regionais, dias de festa.
Carnaval existe em outros lugares, só que nenhum é igual ao brasileiro. E aí as tais religiões que se acham as únicas resolveram há anos “demonizar” a festa tão genuinamente brasileira difamando, rogando pragas, chamando sambistas e carnavalescos de demônios, entre outros termos nada amigáveis e que o “líder” que eles dizem seguir nunca falaria (Ele é o meu líder também, mas eu sigo seus Reais Ensinamentos que são totalmente baseados no Amor ao Próximo, a inclusão, ao respeito, ao não julgar ninguém e nem ditar regras, vira e mexe me pergunto se o Jesus que essas pessoas dizem seguir é o mesmo Jesus, Deus Filho, que eu, Padre Júlio Lancelotti e outras pessoas seguimos, porque o Cristo sempre falou de Amor e sempre defendeu os oprimidos, os diferentes, os marginalizados e se irritou apenas com aqueles que queriam tornar o templo, o lugar sagrado, em um local de comércio: A Cesar o que é de Cesar, a Deus o que é de Deus).
E o Hip Hop? O Hip Hop também foi criado por afrodescendentes em uma área periférica dos Estados Unidos. Assim como o Samba e outros estilos musicais e artísticos de influência afro, em diversas partes do mundo, conseguiu tirar crianças, adolescentes e jovens dos perigos das ruas e mostrar que sonhar é possível e que periferia pode e deve ser Potência.
Racionais MC tem uma mega história e estão diretamente ligados ao sucesso do Hip Hop em terras brasileiras assim como outros rappers, B.Boys, B.Girls, DJ’s, e grafiteiros e grafiteiras. Gente que já teve que fugir da ação policial apenas por estar mostrando a sua arte como os pioneiros do Breaking, na estação São Bento do metrô.
Por que o Hip Hop incomoda tanta o status quo? Assim como o samba e o carnaval incomodam?
Sou da opinião que se a pessoa fica indignada com alguma coisa e diz estar sendo “demonizada” como no caso dos policiais que estão repudiando a escola de samba Vai Vai é porque existe pelo menos um fundo de verdade, manja aquela: quem não deve não teme, então foda-se o que estão falando…
Cansei de ser chamada de coisas que não sou e minha reação é sempre cair na risada e nem me dar o trabalho de responder porque dizerem que sou isso ou aquilo não me faz isso ou aquilo. A partir do momento que preciso me vitimizar como piliciais, delegados e políticos, fazendo um Mi Mi Mi desnecessário eu estou assinando embaixo da crítica, afirmando: eu sou sim tudo isso. Polícia mata pobre, preto, periférico.
Foram políticos, e o bando de extrema direita, reacionários que não querem perder seus poderes, que fizeram questão de criar o termo Mi Mi Mi para falar das importantes causas afirmativas defendidas pelas “minorias” população negra, mulheres, LGBTs, PcDs, entre outros e agora o veneno de vocês tá voltando para vocês: Mi Mi Mi é fazer nota de repúdio para a escola de samba que mostrou a verdade da polícia que mata ao invés de proteger a população, sem distinção de raça, cor, credo, etc.
Vocês não aguentam uma crítica real feita em um desfile de 1 hora na avenida que escrevem nota de repúdio, queria ver vocês morando nas periferias e sendo todo dia parado por policiais que quase te deixam nu, te humilham, porque você é preto e pobre… Como vocês agiriam?
Viva Vai Vai, viva o Samba, Viva o Hip Hop, Viva Racionais Mc, Sabotage, MCs, DJs, B,Boys, B.Girls, grafiteiros e grafiteiras. Viva a arte que transforma! Viva a arte que empodera, viva a arte popular!
Hip Hop salva, a Rota Mata!